Amiga 2

Ela pensava em trabalhar numa companhia aérea; eu, ser atriz entre outras centenas de coisas. Ela desejava viver no Rio, com o pai. Eu achava que no Rio ou São Paulo, poderia trabalhar e estudar teatro. Meninas sonhando, mas queríamos mesmo era experimentar. 

Lembro-me que ela me achava bonita, era um carinho que gostava de me dar com frequência. Eu também a achava e retribuía sempre. 
Por gozação, provocação, entrávamos no prédio da universidade de mãos dadas, fingindo sermos gay. No elevador mãos coladas e risinhos entredentes – ela inventava por pura farra de ver os olhares preconceituosos que nós recebíamos... Chegou uma vez, para fazer prova de estatística depois de ter bebido e enfrentou o professor, gozando de seu ar sério: não havia entendido o assunto ou estudado para o teste - sei lá - e, um tanto zonza, ria bem alto após ler cada questão. Inventava passeios de bicicleta de longa distância, de nossa cidade a outra na região metropolitana e eu topava: duas malucas sozinhas em rodovias, de bicicleta!... Duas malucas num trem rumo ao interior, à casa de uma outra amiga de curso: divertimo-nos demais lá – de forró à bicicleta, ladeira acima, ladeira abaixo. Voltamos pra capital de carona, pois ela não queria voltar nem de ônibus, nem de trem. Colocou um desenho imitando um binde indiano, entre sobrancelhas, sabe-se Deus porquê, e lá fomos nós para a rodovia. A carona? Um matuto talvez rico, subprefeito, segundo ele, de alguma cidadezinha, chato pra caramba e... armado – quando vimos a arma, estremecemos. Perguntou sobre o binde , se era alguma coisa com religião e ela disse que sim, bem séria. Respondíamos a tudo disfarçando o medo. O carro quebrou na entrada de nossa cidade e ele queria que nós duas o empurrássemos – olhamos uma para outra como se concordássemos com um "não" bem grande: aí apareceu alguém para o ajudar, agradecemos pela carona e abandonamos o matuto quase correndo para bem longe dali.Deus nos protegeu...

Na sala de aula do nosso curso, desafiava-me a beijar um colega que não tirava os olhos de mim sempre que vinha para as aulas. Muita gente já trabalhava e muitos eram bem mais velhos que nós, pagavam apenas algumas cadeiras: esse colega era um deles, não tão mais velho e muito interessante! gostava do jeitão dele. Topei o desafio e no meio de uma aula, ele sentado lá atrás, olhando para mim e sorrindo meio tímido, caminhei até ele e tasquei um beijo na sua boca, na frente de todo mundo. Acho que o deixei meio atordoado, pois arregalou os olhos pra mim como logicamente, não esperasse tamanha coragem de minha parte. Ele viajava sempre a trabalho e mandou-me numa das vezes, cartões postais cheios de carinho, mas não os guardei. Não me lembro o porquê. Também não sei a razão até hoje de não termos namorado, a não ser o fato de que foi por minha culpa, meu jeito de ser na época... tão inconseqüente. Ele era sério e tímido - não sabia, mas essa era a razão de minha queda por ele! Sabe que o encontrei duas vezes depois de muito, muito tempo? De longe nos cumprimentamos. Seu olhar quando me viu, nos dois encontros, tornou-se um tanto melancólico, como se lastimasse o fato de não ter rolado nada entre nós - Eu lamento também, não ter investido em conhecê-lo.Destino.

Mônica estudava inglês já há algum tempo, mas um dia quis também francês –estava entediada, queria variar e gozava de mim por escolher italiano. 

Mas muitos desafios ela sempre me conferiu – bons desafios, pois me ajudaram a vencer um pouco de mim mesma, meus bloqueios, meus grilos. Fomos separadas pela imaturidade, a mesma que nos uniu. 
Segui em frente e descobri meu verdadeiro caminho, sem sonhos e sem depender de ninguém para ser eu mesma. Meu amor por ela nunca morreu.

 Soube algum tempo atrás, que se casou com um  italiano e até aquele momento, morava na Itália. Destino.

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