A Cama Redonda

 Ele a conhecera na casa de amigos. Na verdade ele estava passando o final de semana na praia. Já era madrugada e levantou-se com sede, à vontade, sem camisa. Estava indo até a geladeira quando a campainha toca e ele parado sem saber se atenderia. Esperou... como ninguém aparecia, decidiu ir até a porta e espiou pelo olho mágico – estava lá uma visão que não esperava àquela hora da manhã; hesitou em atender, olhou  mais uma vez e a imagem continuava lá: uma garota de jeans,  cabelos longos ondulados e claros, olhos enormes, lábios vermelhos e grossos. Era o que via, mais uma mochila nas costas e outra mala na mão. Abriu e sorriu para sabe Deus quem era:
 - Meu tio está? perguntou ela,  o olhando discretamente de cima a baixo(...)

Comprava e estocava algumas coisas para o novo apartamento: a última aquisição foi uma cama redonda especialmente encomendada e, é claro, inspirada nela, - “uau!” - uma ousadia que se permitiu. Analu assistia a tudo sem parecer se incomodar, intuía seu objetivo, mas decididamente não se deitaria com ele, não compartilhava seus desejos. O objetivo dela estava bem definido e na relação com Caio, apesar de ele não levá-la em consideração, planejando uma vida a dois,  ela não dava nenhuma margem para que pensasse que algo entre eles poderia acontecer.
Mas o tempo passava, o mês na casa do tio, anteriormente planejado, estava quase no fim e Caio não havia ainda alugado o tal apartamento. Ana Luiza queixava-se a ele , de não poder mais esperar. Arrependida de ter concordado em ficar, disse-lhe isso. Sem o endereço prometido, estando na praia, longe da capital, trabalhar e estudar como planejara estavam bastante comprometidos. Suas reservas de dinheiro diminuíam e a angústia aumentava: “Como podia ter sido tão boba! deveria ter seguido meu caminho! droga!”  pensava e ficava com raiva de si mesma.  Caio sabia -a impaciente e pedia-lhe mais um pouco de tempo - arrumou um lugar na casa de uma amiga na capital:  – Por enquanto! Vá! Como não haveria de desistir de algo que  já havia investido, era preciso dar tempo ao tempo e aceitou... por enquanto.

Tentou sempre se virar sozinha, saia  em busca da sorte, de pessoas, mandou fotos para agências de emprego temporário. Entretanto, passou a exigir dele tantas coisas e Caio não media esforços, embora não esclarecesse o porquê da demora em achar um lugar – o que a chateava ainda mais. Suas vontades, seus caprichos seriam pequenas vinganças, uma forma de dizer: “agora me banque!”: certa vez perdeu-se na cidade e, sem se esforçar, ligou para o trabalho  dele – Caio mandou um motorista da firma ir pegá-la. Ele bancava mesmo: roupas, restaurantes, tudo que pudesse fazer para vê-la feliz, ou, pelo menos, contente. Queria tê-la por perto, queria conquistá-la, só isso.

Finalmente o apartamento novo. Mudança acontecendo: a  tal cama redonda de casal, o som, a tv, um aquecedor e só. Muitos risos por mudança tão reduzida e inusitada         – Cadê a geladeira e o fogão, Caio? E ele apenas ria. Sozinhos agora na mesma casa. Analu não lhe perguntou “Cadê a minha cama?” – acomodou-se num outro quarto e dormiu no chão.
Caio, na cama redonda, mais uma vez sonhando, talvez se preocupando com ela, mas sem atitude. Ela com frio, no chão duro, o corpo doendo e zangada: “nem tem a coragem de me convidar para dormir com ele... mesmo que eu recusasse, e daí? Bobo! não sabe seduzir...” Parecia assunto proibido: de manhã, nem um comentário.

Ele estava no quarto, quando Analu passa no corredor enrolada numa toalha... fechou os olhos numa careta impaciente e  começou a fazer exercícios físicos, precisava suar, malhar até a exaustão, a cabeça em parafuso, o corpo de homem excitado. Ela voltou e a porta entreaberta: o observa em ato - o corpo bonito, os músculos em forma, moreno e suado. Sentia carinho por ele no meio de tudo: um homem sensível, companheiro, cavalheiro que fazia todas as suas vontades ou pelo menos tentava sempre agradá-la. Tinham gostos parecidos - gostavam de teatro, idas a museus...corriam juntos no parque, foram a eventos... Mas para ela faltava algo, talvez a pegada, um pouco do macho, um pouco de raiva, de sangue, queria-o irritado com seus caprichos, tentando dominá-la – quanto mais a agradava mais ela o distanciava.

Numa tarde, quando Caio chegou do trabalho e no quarto enquanto se trocava, Ana Luiza comunica sua partida, já com a passagem na mão: seguiria viagem. Caio ficou pálido, nervoso, tentou em vão demovê-la da idéia.
Sentados na cama redonda, ela estava decidida e, carinhosamente,  tocou-lhe o rosto. Ele num impulso, ajoelha-se e diz em tom de súplica que não fosse embora, que nunca amou alguém como a amava, que não conseguia ver mais sua vida sem a presença dela: – Fica! preciso de você. Entregue estava Caio, e Analu não o queria a seus pés.

Levou-a ao aeroporto, comeram juntos um banana split e ela se foi. Ele mandou-lhe mais tarde, um livro de presente, com uma carta carinhosa, quente ,declarando-se eterno apaixonado. Ela ligou para ele dizendo que estava feliz, realizando mil coisas e... apaixonada por outro alguém.
Rossana

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