Uma Imagem na Dor

Fui para a maternidade às 3 horas da tarde.
Após caminhar e almoçar muito pouco, estava me sentindo esquisita - cansaço?  não sabia se era isso...
O corpo não me pedia pra deitar ou dormir.
Pensei em sair da poltrona para beber água, fazer alguma coisa, pois não estava prestando a atenção ao filme do dvd. Assim que me levantei, senti o líquido quente escorrendo pelas pernas... meu bebê queria vir ao mundo...

Sete anos antes, entrara na maternidade à noite sentindo muita dor... sangrava. Estava perdendo um bebê após um mês de gerado. Chorava tanto, não dava ouvidos a  ninguém que me pedisse calma; chorava não pela dor que deveras sentia fisicamente, mas pela dor da alma, a dor da perda de algo muito importante e que desejava imensamente. Chorei por meses a fio - sentia-me culpada por não ter tomado cuidado: era sempre assim, sempre coloquei em mim primeiro, o peso dos erros e muito raramente o dos acertos;  sempre fiz a mea culpa  - ao contrário de tanta gente, sempre assumi até o inadmissível. O exagero. O extremo. Para mim, a perda  era Deus me dizendo com a dor,  que é preciso assumir as responsabilidades que o querer envolve...

Tomei um banho, troquei de roupa enquanto meu filho mais velho limpava o chão e meu marido corria de um lado para o outro pegando documentos e a mala que já estava pronta há alguns dias. As contrações só eram contrações  - a expectativa de vê-lo em meus braços e antes, a preparação para um enfrentamento tão importante deixava-me em alerta e a dor passava a ser algo  visto como... contração. E a dor (dor? que dor? ) que fosse sentir a partir dessas contrações seria nada, diante do que a dor da perda de um bebê nos faz sentir. Meu filhinho mais novo estava chegando, dessa vez não haveria perdas.Eu sabia.

Algumas horas se passaram e já estava pronta para os procedimentos finais - as contrações aumentavam e eu não conseguia deitar de costas - a melhor posição era de lado. Ficaria assim se não tivessem me exigido  a posição correta - e lá vinha mais contração, agora diminuindo os espaços entre cada uma e tanta coisa passando pela minha cabeça e o medo de não resistir - e se não resistir? morrer. Entretanto, lucidamente, racionalizei que dar a luz, parir, é vida, é magicamente viver e eu não deveria pensar no contrário e deveria fechar meus olhos e deixar sentir a primeira imagem que viesse na minha mente e assim, a imagem veio: veio uma noite, uma luz distante, muito alva quase florescente. Percebi que a luz desenhava uma pequena casa, talvez apenas um telhado e intui (uma mensagem?)o que seria a imagem  de um nascimento especial - lembrava a imagem que todos fazem do nascimento do Cristo e a ela, a imagem, eu me agarrei com força e consegui sorrir... sentindo dor.
Era Julho e meu bebê nascia em meio aos gritos do médico e auxiliares, dizendo que estava coroando - aparecia sua cabecinha para fora de meu corpo.

Minha primeira missão estava cumprida.
A dor não era mais dor, nem contração... Não lembraria mais dela e então, só sentia um alívio e uma enorme vontade de colocá-lo no peito e amamentá-lo com todo o Amor que pudesse doar.











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