Uma cerimônia

Era alto o edifício antigo. Da janela do ap que abria toda a sala para uma paisagem, assim como no quarto, via-se o mar, um porto e parte de uma velha cidade. Esse era o altar. Do alto do edifício.
Na mudança, feita num fusca antigo mas não velho - roupas, livros, objetos pessoais, uma escrivaninha pequena, estilo antigo, e um sofá cama também pequeno. Tudo isso (só isso?!) dentro de um fusca. Esses, os seus pertences. Os preparativos do casamento. O ritual estava sendo feito pela noiva.

Limpar as vidraças que foram deixadas pintadas pelo antigo inquilinocom certeza com o objetivo de economizar nas cortinas:  Não saía com nada, a tinta cor verde - parecia não ter solvente para ela! E os noivos ralaram até que a irmã da noiva, tentando apenas limpar a poeira e o que não parecia ter jeito, usou um pano molhado com água e... a tinta... miraculosamente saiu!  - Risos e aplausos: mais uma parte do ritual - era o arroz jogado pelos convidados.
Compraram o enxoval antecipado: uma geladeira, a cama, alguns pratos e panelas e coisas úteis, um fogão de duas bocas e um mixer. Muita lasanha seria feita e a festa continuaria por toda a lua-de-mel...

Ap arrumado. Hora do casamento aproximando-se. O padre chegou  mais cedo em forma de lua cheia brilhando sobre o mar. Sua túnica branca, esplendorosa naquela capela azul escura, com nuvens claras que era o céu. O mar refletindo tudo como num flash de cameras fotográficas, em suas águas. Um navio ao longe, pronto pra aportar, com suas luzes, tal qual um candelabro naquele templo sagrado. No altar.

Os noivos,  depois do cinema de última sessão - que aliás não houve por falta de energia elétrica - encontraram os elevadores sem funcionar pelo mesmo motivo e subiram pelas escadas - a escadaria da igreja. Tantos degraus que perderam a conta, mas tão felizes que estavam que nem se deram conta... nem se deram trabalho de contar... Subiram rindo, divertindo-se com tudo ( o amor descansa o corpo quando é grande!) Nada poderia atrapalhar aquele ritual de passagem.

Chegaram finalmente no templo - 13o. andar. Tudo escuro em volta, menos o altar que brilhava à luz da lua. Velas e a música acionada pelo noivo, em seu antigo som que também trouxera na sua própria mudança, era suave. A aliança em forma de beijo, de beijo quente e prolongado... Eles, o casal, dançaram colados e simplesmente felizes, iluminados pela lua... 

Naquela pequena "igreja" de apenas um quarto, banheiro, sala e uma cozinha tão pequena que não cabia a geladeira, o amor foi selado na sala, no tapete de palha artesanal, com ritmo, em brilho prateado e testemunhado pela velha cidade - lá embaixo, brilhando timidamente com suas poucas luzes ao longe... silenciosa, em respeito ao amor.

Apenas um casamento.
R.

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